sábado, 18 de maio de 2013

Delírio, Lauren DeStefano [Opinião]





Título Original: Fever
Autoria: Lauren DeStefano
Editora: Planeta Manuscrito
Nº. Páginas: 231
Tradução: Nuno Daun e Lorena


Sinopse:

Rhine e Gabriel fugiram da mansão, mas o perigo nunca ficou para trás.
Para Rhine de dezassete anos, a arriscada fuga do casamento polígamo parece ser o princípio do fim. A evasão leva Rhine e Gabriel a uma armadilha sob a forma de uma feira popular, cuja dona mantém várias raparigas prisioneiras, Rhine acaba de fugir de uma prisão dourada para se meter noutra ainda pior.
A jovem acaba por percorrer um cenário tão sombrio como o que deixou há um ano - que reflecte os seus sentimentos de medo, desespero e desesperança.
Com Gabriel a seu lado está decidida a chegar a Manhattan para se encontrarem com Rowan, o irmão gémeo, mas a viagem é longa e perigosa e o que Rhine espera que seja uma segurança relativa revelar-se-á muito diferente.
Num mundo onde as raparigas só vivem até aos vinte anos e os rapazes até aos vinte e cinco, o tempo é precioso e Rhine não tem como escapar nem iludir o excêntrico sogro Vaughn, que está determinado a levá-la de novo para a mansão... a todo o custo.
Nesta sequela de Raptada, a heroína tem de decidir se a liberdade vale a pena, pois tem mais a perder do que nunca.


Opinião:

Estou ainda tão desolada, tão assoberbada de emoções contraditórias, pensamentos insinuantes e reflexões perdidas acerca deste livro que, por mais incrível que pareça, não estou certa de saber o que escrever sobre ele. Não vos quero estragar a imensa surpresa que é esta continuação, depois de um primeiro volume tão espectacularmente bom, mas a verdade é que sei não existirem palavras suficientes para descrever o que este livro, o que esta obra é na sua real essência. Por isso, se ainda não percorreram as fatídicas páginas da trilogia de Lauren DeStefano, encarem esta minha opinião como um convite a fazê-lo, um convite a perderem-se num mundo tão sujo, tão poluído mentalmente, que ser-se mulher é o maior perigo que se pode, alguma vez, enfrentar.

Delírio é como um devaneio constante, como uma febre que não mata mas desgasta, consome toda e qualquer réstia de esperança, de felicidade, que existe no universo medonho e claustrofóbico de uma personagem inconformada com o seu próprio destino. Delírio é a ferida que não sara, a cabeça que não cessa de rodopiar, a visão turva que não recupera da nauseante sensação de perda de controlo, perda dos sentidos. Delírio é o meio que oferece algumas respostas, que destila tantas outras perguntas e que permite, ao leitor, fazer uma escolha—a de querer mesmo, ou não, saber a verdade escondida para lá de uma nação perdida, e de uma mansão assombrada pela morte que percorre cada um dos seus corredores.
Lauren DeStefano expressa a sua incalculável imaginação e criatividade de um modo tão natural e apelativo, que rapidamente se torna tarefa impossível colocar a sua narrativa de lado. A sua escrita é fresca e absolutamente empática—algo fabuloso no que diz respeito à transmissão, para o leitor, de todos os receios e desejos sentidos por parte das personagens—, mas também o seu estilo é intrigante ao conferir a dose certa de suspense e intriga a uma história que, por si só, tem já tanto para dar.

Nada poderá, alguma vez, ser fácil, num mundo onde a Nova Geração se vê persistentemente confrontada com a iminência da morte e com o aparecimento repentino, insuspeito, dos primeiros sintomas do vírus, e talvez seja por isso que a jornada encetada por Rhine e Gabriel seja tão impressionantemente devastadora. E é este pequeno elemento de falsa esperança e constante movimento que transforma Delírio numa leitura alucinante, pelos meandros de uma feira das vaidades opressiva e desafiadora, e pelo regresso a um dos locais mais assustadores e odiados pela nossa protagonista.
Rhine continua a ser uma figura que transmite força e esperança, e que se deixa levar pela preocupação genuína que sente pelos outros, mas nem o seu intelecto díspar e coragem sem igual a livram de quaisquer fragilidades, e é por isso que esta é a personagem que mais impressiona e mais cresce quando quebrada pelo choque do nada, do desaparecido. Mas Gabriel, mesmo não conhecendo o mundo exterior, mesmo não sendo detentor da firmeza de Rhine, é um porto seguro, um conforto que não amolece e uma companhia que se aprende a amar, e que de tudo fará para proteger os que mais lhe são queridos. De cada vez que relembro todos aqueles momentos de tortura física e psicológica, e do apoio que cada um prestou, nunca abandonando o outro, nunca desistindo daquele que se transformou no mais precioso de todos, é um sorriso que sinto aflorar-me os lábios e uma fé, uma esperança que penso, que acredito de que tudo vá ficar bem.

Oh, tantos são os elementos que permitem esta obra brilhar no meio de tantas outras distopias, e isso deve-se também, em parte, aos intervenientes secundários que enriquecem a narrativa despoletando algumas das situações mais inebriantes e perigosas. Nunca esquecerei a destemida Lilac que roubou um pedaço do meu coração, nem tão pouco a sua querida e pequena Maddie, portadora de uma inteligência aguçada mesmo quando retardada por algumas, poucas, malformações; nunca esquecerei Claire pelo carinho que nutre por cada uma das suas crianças, nem de Silas pela aparência enganadora que emana, principalmente quando o seu interior é tão, tão doce; e muito menos esquecerei Deirdre ou Cecily, Linden ou Vaughn.
Também as mensagens e temas abordados são factores de extrema importância—e até algo ambiciosos—para o desenrolar da história. E se a narrativa em si não for suficiente para impressionar, com certeza que a imensidão conflituosa de temáticas surpreenderá e, acima de tudo, fará o leitor pensar e reflectir em tudo o que leu e desvendou. Desde a pobreza extrema à revolução de uma sociedade que está em guerra consigo mesma, passando pela perseguição desenfreada e pela exploração, sem quaisquer pudores, do sexo feminino, estes são somente alguns dos elementos explorados neste romance distópico e que deixará muitos dos seus leitores com pele de galinha.

Adorei, adorei este livro—nota-se, certo?—e a verdade é que mal posso esperar por deitar as mãos ao terceiro e último volume desta trilogia que já me cativou por completo—aliás, espero que a Planeta não demore muito a lançá-lo.
Toda a ambiência sinistra e obscura que envolve a mansão de Vaughn e as experiências que ele faz nos corpos das suas empregadas e das noivas de Linden, todo o perigo envolvente da Feira Popular com as intenções dúbias de uma Madame que, no seu íntimo, é incapaz de amar e confiar, e todos os sintomas e consequências provocados pelo Sangue-de-Anjo e por uma doença inteiramente desconhecida retratam alguns dos meus momentos favoritos não somente em termos de acção mas, e principalmente, em termos emocionais e psicológicos. E é por instantes narrativos como estes que a minha admiração pelo género e, aqui, em particular, por Lauren DeStefano é tão grande e especial.

Uma aposta absolutamente brilhante e peculiar por parte da Planeta Manuscrito, num estilo que se encontra em actual expansão e que já conquistou uma enorme parcela de fãs, e numa história perfeita para os fãs de obras como Cinder, de Marissa Meyer ou Desaparecidos, de Michael Grant. Cinco estrelas!

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