Título Original: Memoir of an imaginary friend
Autoria: Matthew Dicks
Editora: Planeta Manuscrito
Nº. Páginas: 322
Tradução: Victor Antunes
Sinopse:
O meu nome é Budo
Existo há cinco anos.
Cinco anos é muito tempo para alguém como eu. Foi Max quem me deu o nome. Max
tem oito anos. Max é o único ser humano que consegue ver-me.
Sei aquilo que Max sabe e algumas coisas que não sabe. Sei que Max corre
perigo. E sei que sou o único que pode salvá-lo.
Uma calorosa história de amor,
lealdade e poder de imaginação; um romance perfeito para quem já teve um amigo —
verdadeiro ou não.
Opinião:
Não existe nada no mundo que
eu mais aprecie e admire, enquanto leitora, que a capacidade transcendente que
um dado livro, uma simples história de ficção, tem de surpreender. Uma imaginação
fértil, um contexto actual, sólido, e uma escrita avassaladoramente intemporal
são somente três das várias e poderosas características que Memórias de um amigo imaginário possui
em seu favor. Confesso que este foi romance que captou a minha total atenção a
partir do momento em que ‘lhe pus a vista em cima’, e com o qual sofri
desmesuradamente pela intensa necessidade sentida de o folhear e o tempo
limitado, e disponível, para o fazer, mas verdade seja dita que nada poderia,
alguma vez, ter-me preparado para o misto de emoções, de ensinamentos e
mensagens, de pura adoração que acabaria por encontrar—por partilhar—em Budo e
em Max.
Tendo encerrado mais um capítulo
da minha existência literária há somente breves momentos atrás, ainda me é
extremamente difícil descobrir, desvendar—encontrar—, as palavras certas e os
sentimentos correctos perpetuados em mim acerca desta obra. É verdadeiramente
impressionante o modo como o autor, Matthew Dicks, alcançou o ponto certo de
sensibilidade, amizade e sofrimento, ao mesmo tempo que foi tecendo linhas
imaginárias que todos nós, em algum instante da nossa vida, acreditámos serem
reais. Budo representa, então, o amigo fictício do leitor comum, e a consciência
permanente e obscurecida presente em todo o ser humano, pois quem nunca se
questionou sobre as sensações que acompanham a morte? Ou acerca do que existe
para lá do túnel luminoso?
Budo é o receio que todos nós
sentimos, por vezes o egoísmo que deixamos levar a melhor, mas é também a
coragem e a força, a afeição genuína, virtuosa, que nos acompanha. E Max é o
seu criador ‘verdadeiro’, o menino de carne e osso que sonhou um amigo que o
compreende, que o aceita e que sabe lidar com a condição autista que o afecta.
Pois Max não é uma personagem simples, muito pelo contrário, ele é uma figura
complexa e extraordinariamente intricada de definir, e embora a sua doença seja
transmitida ao leitor com uma certa leveza de naturalidade e sentido de ‘normalidade’,
é perceptível as várias camadas que o compõem, e os diversos cuidados de que
precisa e, com certeza, precisará ao longo da sua ‘vida’.
Mas esta é uma história de
teor bastante mais denso, abordando temas que demasiadas vezes nos passam ‘despercebidamente’
em frente dos olhos. Fala-se de possuir a destreza para tomar decisões
complicadas, e de ser capaz de enfrentar medos que nos atormentaram durante uma
eternidade, mas também se escreve sobre sacrifícios pessoais em benefício do
outro, sobre perigos escondidos no sorriso falso de um rosto conhecido, e sobre
imaginários imprevisíveis, absolutamente excepcionais, conhecedores de
sabedorias ancestrais. É que estes amigos ilusórios como Budo, Oswald ou Verão podem
ser ‘intervenientes’ enganosos da realidade que nos rodeia, mas neles
encontram-se os receios e a audácia, a bravura, que se debate ‘escondida’
dentro de cada um de nós e que, por vezes, ‘sente’ a necessidade de ‘saltar cá
para fora’. E é por isso, talvez, que estes nomes lendários detém uma importância
tão vincada neste enredo, ao ponto de poderem tocar os objectos da vida real,
e, mais relevante ainda, de salvarem vidas.
Na minha opinião, este é o
romance perfeito para se oferecer a um melhor amigo, ou para se ler quando se
sente saudades da profunda e calorosa sensação de familiaridade que uma presença,
uma companhia afectuosa tantas vezes transmite. Uma narrativa para todas as
idades, sobre uma vida humana que diariamente se vê confrontada com as
dificuldades do mundo, do diálogo e dos sentimentos, e que encontra na
fertilidade da sua imaginação a resposta certa aos seus problemas. E como é
bela a forma como Budo transmite força e valentia a Max, fazendo-nos recordar,
numa constante, que por vezes, para sermos felizes, para escaparmos às enfermidades
da vida e sobrevivermos aos obstáculos que se atravessam à nossa frente, é
preciso ter-se coragem e encontrar meios de seguir em frente ao invés de nos
acomodarmos, de nos deixarmos ficar no limbo da neutralidade, no centro do que é
nada.
Uma obra com carimbo Planeta
Manuscrito, que muito mais, para além do que por aqui divaguei, tem para
mostrar aos seus leitores. Um livro que marca pela diferença e pela
universalidade do seu tema, do seu público e do seu conteúdo. Não deixem de o
ler.
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