domingo, 6 de maio de 2012

O Sorriso das Mulheres, Nicolas Barreau [Opinião]



Título Original: Das Lächeln der Frauen
Autoria: Nicolas Barreau
Editora: Quinta Essência
Nº. Páginas: 282
Tradução: Augusto Melo


Sinopse:

Para Aurélie Bredin, as coincidências não existem. Jovem, sensível e atraente, é a proprietária de um pequeno e romântico restaurante, Le Temps des Cerises, situado no coração de Paris, a dois passos do Boulevard Saint-Germain.
Naquele pequeno restaurante forrado a madeira, com toalhas aos quadradinhos vermelhos e brancos, o seu pai conquistou o coração da sua mãe graças ao menu d’amour. E foi ali, rodeada pelo aroma do chocolate e da canela, que Aurélie cresceu e onde encontrou consolo nos momentos difíceis da vida.
Mas agora, magoada pelo abandono de Claude, nem sequer a calidez acolhedora da cozinha é capaz de consolá-la.
Uma tarde, mais triste que nunca, Aurélie refugia-se numa livraria. Um romance, O Sorriso das Mulheres, chama a sua atenção. Quando o folheia, descobre que a protagonista é inspirada nela e que Le Temps des Cerises é um dos cenários principais.
Graças a esta prenda inesperada, volta a sentir-se animada. Decide entrar em contacto com o autor, Robert Miller, para lhe agradecer. Mas isso não é fácil. Qualquer tentativa de conhecer o escritor – um misterioso e esquivo inglês – morre na secretária de André Chabanais, o editor que publicou o romance.
Porém, Aurélie não desiste e quando um dia surge efectivamente uma carta do autor na sua caixa de correio, acaba por daí resultar um encontro bem diferente daquele que tinha imaginado...


Opinião:

«No ano passado, em novembro, houve um livro que me salvou a vida.»
Há quem não perceba o vício e a mudança que uma simples leitura pode originar em todos aqueles que não resistem a deliciar-se com um enredo bonito. Entre nós, mulheres de sorrisos cúmplices, existe uma ligação especial, um entendimento perfeito que, ao ler a belíssima frase com que esta obra inicia o seu curso, se manifesta em muito para além da compreensão chegando, inclusive, até bem fundo no coração. É que a vida pode não ser um romance, um conto de fadas com um final feliz mas, ás vezes, de página em página, um mero sorriso pode ser o remédio de excelência para alegrar, ou fazer esquecer, o dissabor de um dia menos bom. E é por isso, e por muito mais, que acredito que, ocasionalmente, um livro pode ser a salvação há muito querida.

O Sorriso das Mulheres não é, para mim, um livro comum. E ainda que se desenrole através de uma trama simples, descontraída e extremamente fluida, este é um romance que se amplifica pelo aconchego e afecto que transmite, permitindo ao leitor esboçar o mais honesto e encantador dos sorrisos, seja qual for o seu estado de espírito no momento.
Dotado de uma escrita terna e que transborda conforto, Nicolas Barreau estreia-se em terras lusas com uma história moderna e profundamente romântica, onde o amor, esteja ele onde ou com quem estiver, interpreta aqui o papel de destaque, expondo-se, em todas as suas formas, com gestos de impulsiva paixão ou sensações de intensa mágoa.

Um coração destroçado pode ser o recurso que leva uma mulher à loucura, pois quando o amor se julga verdadeiro, a surpresa do abandono constitui um assalto aos sentidos e à mente impossível de ultrapassar. No dia em que Aurélie perdeu o seu pai, a consistência que tinha vindo a construir durante toda a sua vida viu-se, subitamente, estilhaçada em mil e um pedacinhos de dor e amargura, mas no instante em que Claude a entregou à solidão desconhecida, Aurélie nunca pensou que essa inesperada renuncia fosse doer ainda mais. Aos poucos e poucos, há que ir reconstruindo o muro que se viu fragmentado pelo desgosto, porém, esta não é uma personagem que esteja desamparada, e com a ajuda de uma amiga muito especial e de um livro que promete um futuro totalmente novo e expectante, talvez ainda se possa encontrar esperança ao fundo do túnel.
A mentira é uma fórmula poderosa, pois não só engana e esconde como pode causa sofrimento. E quando o feitiço se vira contra o feiticeiro, no preciso momento em que a mulher do sorriso primoroso volta a entrar, de rompante, no seu destino, André terá de tomar uma das mais complicadas decisões da sua vida. Contar a verdade ou... prolongar a ilusão? Talvez lhe fosse possível desmistificar o mistério que envolve o autor de um romance cheio de promessas, mas se nem no seu emprego lhe é permitido sequer fazer uso da sua total capacidade de escritor, como conseguirá, alguma vez, conquistar a mulher dos seus sonhos com a mais pura sinceridade?

Como casal protagonista, estas duas personagens são de um encanto e elegância extraordinários, partilhando com o leitor, e sem qualquer pudor, todas as suas dúvidas e dilemas, vontades e sentimentos. Mas também o leque de intervenientes secundários é um autêntico doce, incluindo personalidades como a sensível e empenhada Mademoiselle Mirabeu, a directa e constantemente presente Bernadette e, até mesmo, o charming e lovely gentleman Sam Goldberg. Agraciando o enredo com tiradas cómicas ou momentos ligeiramente mais sérios e comoventes, este conjunto de personagens é exímio na forma em como comunica, através da palavra escrita, com o leitor, possibilitando a que seja entretecida uma ligação extremamente forte e emocional entre quem lê e quem é lido.

O cenário é do mais belo e romântico que possa surgir, por entre as sinuosas e cosmopolitas vielas da eterna Cidade da Luz. Paris é sempre um pano de fundo de suprema beleza, que não só confere à trama um certo travo de magia e possibilidades infinitas, como ajuda à representação de uma história de amor entre duas pessoas que ainda não sabem o que sentem uma pela outra, ou como devem lá chegar.
A par com todo o ambiente de derradeiro primor, encontra-se um estilo de escrita peculiar e incomparavelmente atractivo. O modo como a própria narrativa se inicia, com uma descrição, na primeira pessoa, de um assalto emocional tremendo e da forma como este se viu gradualmente ultrapassado é delicioso na medida em que, num jeito de confidência entre amigas, o leitor se vai pondo a par do que aconteceu e de como uma vida corriqueira e feita de hábitos se viu irrefutavelmente modificada.

Pessoalmente, esta foi uma viagem que experienciei de um só sopro. Adorei cada momento, cada descrição gastronómica, sentimental e paisagística, cada alusão ao mundo editorial – que tanta curiosidade e interesse me suscita! –, e cada acção, gesto e atitude tomadas em prol do amor e da felicidade. A esperança é uma sensação que nunca deve ser perdida, muito menos quando a desistência, o desespero ou a desilusão se apresentam como o caminho mais fácil e curto. É que por vezes os riscos têm os seus frutos... e se não formos nós a colhê-los, quem será?
Uma romanticíssima e maravilhosa aposta da Quinta Essência, uma editora feminina cheia de charme e airosidade, que sabe, na perfeição, como fazer surgir um sorriso até nos mais tristes dos lábios. «[...] uma vez que a primeira frase, aquela com que um livro começa, é como o primeiro olhar trocado entre duas pessoas que ainda não se conhecem.» Gostei muito. 

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